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Reforma Protestante: Ciência e Democracia

É claro que a Reforma Protestante teve seus podres - sobre os quais falarei em outro artigo -, mas também é importante que seus pontos positivos sejam bem evidenciados, uma vez que a crítica dos céticos se levanta com fervor contra esse evento - e todo o resto do que caracteriza a fé cristã. Segue um breve estudo - tire as suas próprias conclusões.

               Dentro do padrão apologético, decidi estabelecer um panorama sobre a Reforma Protestante, com orientação para suas aplicações nos âmbitos do pensamento científico e filosófico, lembrando que o cerne da Reforma é puramente teológico, num sincero clamor do cristão pela correção da Igreja em suas veredas na Verdade.
                A paixão dos papas pela arte renascentista teve seu preço. A sede de glória papal no período do Renascimento cobrou sua dívida. Papas corruptos e violentos, como Alexandre VI, ou desejosos da construção de uma Nova Roma, maior do que tudo o que o homem já havia visto, como Júlio II, colocaram o Vaticano em descrédito popular e o afundaram em dívidas. Sobre Júlio II (papa entre 1503-13), podemos comentar alguns pontos: almejando um projeto de construção de uma nova Basílica de São Pedro, que colocaria na sombra todas as construções da história anterior, o papa deparou-se com a falta de recursos – que fizeram ser adiados outros de seus projetos, como seu enorme mausoléu. O serviço inicia-se, mas logo trava pela falta de recursos, que nem mesmo o intenso comércio de indulgências em toda a Europa era capaz de suprir. A questão das indulgências, largamente arrecadadas para a continuidade das obras da imensa Basílica de São Pedro, se aperta no pontificado que segue, o de Leão X (1513-21), levantando o descontente monge Martinho Lutero. Fonte: A História Revelada dos Papas, Quero Saber, Edit. Livros Escala, pgs 78-79.
                Antecedentes da Reforma: uma luta de séculos entre o poder papal e o secular, entre papas e imperadores, criou ressentimentos nacionalistas nos estados europeus, de modo que estes procuraram, cada vez mais, a independência de Roma – o que incluía o desgosto pelo pagamento de indulgências, que afetava mais as massas. A Inglaterra logo limitou legalmente a Igreja e a França baniu todos os impedimentos ao poder de seu rei, aplainando o caminho para a formação das igrejas nacionais autônomas.
             Mediante os imensos latifúndios da Igreja –quase 1/3 da Europa, pelos quais não pagava impostos- e a corrupção de gente de todos os escalões da instituição, levantou-se a ira popular. A autoridade da instituição papal também fragilizou-se por intermédio do Cativeiro da Babilônia, quando o rei francês sequestrou o papa (1308-78), e o Grande Cisma do Ocidente, quando três papas reclamaram para si o trono papal (1378-1416), além da visível sujeição da Igreja ao domínio francês. Houve interesse da Igreja de Roma em reformar-se, como se viu no Concílio de Constança (1414-18), onde, infelizmente, não se chegou a consenso algum. As reações de alguns papas nada contribuíram para a melhora dessa situação, como fez Paulo IV (1555-59), incentivador da inquisição que procurou estabelecer resistência sem nenhum concílio, apenas fazendo uso da soberania papal - outra atitude que custou caro foi a que o papa Pio II (1458-64) tomou ao considerar o ameaçador conciliarismo –movimento piedoso contra o poder e o luxo papal- como heresia e impedir qualquer apelo a um concílio geral.
                O humanismo surgiu como uma corrente intelectual que alimentou mentes contrárias ao poder papal – mesmo que vários papas possam ser considerados humanistas. Trata-se do ressurgimento da erudição e dos estudos especulativos clássicos, que veio a substituir o escolasticismo como principal corrente filosófica da Europa Ocidental. Com a chegada a Roma, no século XV, de intelectuais bizantinos fugidos dos muçulmanos, que ameaçavam Constantinopla, manuscritos de sabedoria grega disseminaram-se pelo povo, quebrando o monopólio do conhecimento mantido pela Igreja. A parcela do povo mais instruída, ao ter acesso ao conhecimento clássico, adotou vários posicionamentos filosóficos antigos, como o pensamento antropocêntrico. A nova visão sobre o homem alterou as opiniões sobre poderes políticos e sobre a própria Igreja, o que levou o povo, mais instruído, a insatisfazer-se ainda mais – devemos lembrar que o “povo” aqui referido está mais restrito às elites. Leigos letrados começaram a avaliar criticamente as Escrituras e outros textos dogmáticos, como o italiano Lourenço Valla. Por todo o mundo europeu novos estudos sobre a Bíblia foram lançados e a corrupção da Igreja atacada: Desidério Erasmo (1455-1536) nos Países Baixos, John Colet (1466-1519) e Sir Thomas More (1478-1535) na Inglaterra, Johann Reuchlin (1455-1522) na Alemanha e Jacques Lefevre d’Étaples (1455-1536) na França.
                Uma observação interessante a ser levantada sobre essa questão é que nem tudo era trevas na Igreja Católica pré-reforma: a instituição ainda formava teólogos de valor, pessoas piedosas e transformava inúmeras vidas – o foco de maior atividade intelectual da Europa estava nos domínios eclesiásticos.
                Desidério Erasmo, ou Erasmo de Roterdã, ingressou em um mosteiro agostiniano em 1492, na Holanda, somente quatro meses antes de Colombo partir da Espanha para o Novo Mundo. Erasmo estava ansioso para conhecer as universidades e mergulhas no mundo intelectual, vindo, posteriormente, a lecionar na Universidade de Paris e seus alunos ali, por sua vez, lhe deram a oportunidade de visitar a Inglaterra, onde encontrou-se com vários intelectuais. Depois da Inglaterra, Desidério conheceu os Alpes e Turim, onde tornou-se doutor. O intelectual era demasiadamente culto e conhecia latim e grego fluentemente – o grego era uma raridade, o que lhe abriu as portas para o texto grego do Novo Testamento e lhe garantiu, provavelmente, o posto de primeiro professor de grego em Oxford. Aos 40 anos de idade, o grande pensador tinha lido mais sobre teologia do que os outros europeus costumavam levar a vida toda para ler. O monge agostiniano escolheu, por fim, viver em Basiléia, local da única universidade da Suíça e centro da mais moderna tecnologia, onde havia oficinas de impressão, recurso que Erasmo utilizou para divulgar seus pensamentos – e, assim, publicou a sua retumbante versão do Novo Testamento, que destoava em alguns pontos da Vulgata – um ataque fulminante à soberania de Roma. Erasmo opinou sobre o destino dos recursos das indulgências, que seriam melhor aplicados no auxílio aos pobres, e questionou questões sobre outros dogmas. O famoso e maior intelectual de sua época morreu em 1536 sob um epitáfio que o descreve como servo de Cristo e o mais culto dos estudiosos.
                Antes de Lutero, o Grande Reformador, temos alguns prerreformadores, como John Wycliffe (1329-84), sacerdote e dignitário da Universidade de Oxford, e Jan Hus (1373-1415), erudito pregador em Praga e reitor da Universidade Carlos, que desafiaram os excessos papais e alguns de seus posicionamentos. Martinho Lutero (1483-1546), filho de uma família de mineiros, desenvolveu-se no contexto dos excessos de indulgência cobrados para a construção da magnífica Basílica de São Pedro: tornou-se monge agostiniano na sinceridade de quem fez um voto no meio de uma terrível tempestade – quando visitou Roma espantou-se com as relíquias incontáveis e lastimáveis e o comércio religioso, quando adentrou os mosteiros alemães deparou-se com uma espantosa depravação moral. Sem suporte para suas necessidades espirituais nas desvirtuadas instituições, o monge buscou auxílio exclusivo nas Escrituras. Através dessas leituras, Lutero concluiu que a chave da vida religiosa não está em atitudes exclusivamente concretas, mas no relacionamento do indivíduo com Deus.
Lutero chegou a ser professor na Universidade de Wittenberg –o projeto de seu pai era que se formasse em direito-, onde, certa vez, ao ensinar sobre a Carta de Paulo aos Romanos, vislumbrou-se com a verdade teológica da salvação exclusiva pela fé em Cristo, questionando, assim, as peregrinações, as indulgências, as penitências e outras questões comuns ao seu tempo - como as capelas e catedrais sendo exclusiva casa de Deus e o padre o intercessor entre Deus e o povo comum. Mediante sua nova compreensão, Martinho queria promover apenas uma reestruturação da Igreja, não uma divisão. Sucedeu que, em outubro de 1517, Johannes Tetzel, monge dominicano instituído pelo príncipe Alberto para arrecadar as indulgências que este remeteria ao papa Leão X, chegou a Wittenberg, prometendo a diminuição do tempo no purgatório para quem as comprasse – seu sermão era popular e cativante, possibilitando a venda de pequenos pedaços de pergaminho por altos preços. No dia 31 de outubro desse mesmo mês Martinho Lutero pregou suas famosas 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, onde atacava a venda de indulgências. A obra, traduzida para o alemão e divulgada pela imprensa recém-inventada, distribuiu-se por toda a Alemanha, levantando o povo e as lideranças descontentes. Excomungado em 1521 e ameaçado de morte, Lutero escondeu-se no Castelo de Wartburg, onde traduziu o Novo Testamento do grego para o alemão em aproximadamente um ano, a fim de torná-lo mais acessível ao povo, sendo impresso em 1522 - tendo, por fim, divulgado a Bíblia inteira em 1534, obra fundamental para a criação da moderna língua alemã.
A Reforma iniciou-se nos meios acadêmicos, disseminou-se pelas cidades e, por fim, se alastrou pelos campos. A Guerra dos Camponeses é um marco negativo do período – mas grandes mudanças, muitas vezes, exigem grandes sacrifícios, pois, havendo oposição feroz e covardia da parte dos revoltosos tudo teria acabado somente no prejuízo, sem nenhum acréscimo, sem transformações duradouras. Vale-nos lembrar também que para o contexto da época a guerra não era vista de modo tão deplorável como hoje é, sendo a morte um fenômeno comum no cotidiano do povo. O fato é que Lutero, primeiramente, sugeriu que acordos se fizessem para evitar o conflito, condenando o fato de os camponeses tomarem armas, porém, quando a situação chegou no limite, liberou-os para o conflito, que terminou com 100 mil mortos.
Huldrych Zwínglio (1484-1531), nascido em Wildhaus, foi outro grande nome da Reforma, especificamente no movimento que desencadeou-se em Zurique, na Suíça. Em 1506, aos 22 anos, Zwínglio assumiu a função de páraco de Glarus e, em 1516 empreendeu uma viagem de dois dias até Basileia, com suas gráficas, onde encontrou-se com Erasmo e teve acesso ao seu Novo Testamento. Guerreiro por natureza, chegou a entrar no campo de batalha. Aos 32 anos mudou-se para Einsedeln, uma cidade monástica e, depois, já famoso por sua pregação reformadora, mudou-se para Zurique, onde tornou-se pregador na catedral de Grossmünster – logo no primeiro verão ali presenciou uma forte epidemia que, pelo contado constante com os doentes, que visitava, o contaminou. O reformador morreu em campo de batalha defendendo a causa da Reforma.
João Calvino (1506-64) é considerado um dos maiores reformadores - era extremamente intelectual. Calvino é conhecido por sua natureza séria, impetuosa e sistemática, de modo que, por iniciativa própria, começou a estudar a Bíblia para tirar suas próprias conclusões. Simpático pelas idéias de Lutero, preferiu fugir em direção à Suíça com seus manuscritos mediante a hostilidade crescente de Paris. Em 1536, aos 27 anos, via seu primeiro trabalho publicado – Institutos. Ao chegar a Genebra, Calvino viu uma cidade-estado sendo tomada pelo protestantismo, já sem bispo católico. Ao lado de Guilherme Farel, Calvino procurou tornar Genebra um ideal de cidade cristã, de modo tão indiscreto que o próprio povo da cidade os expulsou – em 1541 o reformador foi convidado para retornar a Genebra, onde tornou-se cada vez mais influente. As decisões morais e a justiça cabiam ao exercício de Calvino, que atualizou e distribuiu suas percepções teológicas ao povo. Uma versão moderna de seu trabalho, traduzida para o inglês, possui 1,3 mil páginas - somente sobre o livro de Ezequiel ele pregou 174 sermões, que se distribuem em 59 volumes. Considera-se Calvino uma enciclopédia teológica ambulante. Depois da morte de seu líder, Genebra serviu como reduto de protestantes fugidos de toda a Europa e os treinava para retornarem às suas terras natais. A disseminação dos ideais de Calvino foi auxiliada pelo eficiente sistema educacional de Genebra, com suas escolas primárias e secundárias e sua academia, que logo tornou-se a Universidade de Genebra que, em 1559 tinha 162 alunos e, cinco anos depois, mais de 1,5 mil.
Um dos frutos da Reforma também está na democracia moderna. Enquanto o catolicismo fundamentava-se na hierarquia humana, os protestantes enfatizavam exclusivamente a Bíblia e o relacionamento com Deus como autoridades. Os protestantes batizados podiam ser sacerdotes de si mesmos e não necessitavam de bispos para apresenta-los a Deus. A Bíblia, através da Reforma, foi traduzida de modo mais acessível a todo o povo, favorecendo o debate e a discussão, traços típicos da antiga ágora ateniense, o berço original da democracia. No mais, cada igreja ou denominação protestante administrava-se a si mesma de todas as formas, dependendo de pequenos comitês administrativos, que se compunham do sacerdote, mas essencialmente de membros da congregação. O movimento em questão também favoreceu o nacionalismo, de modo que deixou de usar o latim, língua internacional, e tomou as línguas locais, erguendo uma era dourada para o alemão, o inglês e o francês. A educação também evoluiu: como a Bíblia estava acessível e o crente era o primeiro responsável diante de Deus, era imprescindível que todos soubessem ler – a reação católica também foi benéfica, pois a instituição passou a investir mais na educação, porém, sem jamais igualar os níveis de alfabetização de países protestantes, como a Holanda, Escócia ou Prússia. 
Podemos considerar a Reforma como o resultado a incapacidade papal de reestruturar a Igreja Católica, nos tempos do Renascimento manchada pela corrupção e pela exploração. A Reforma, em certo sentido, teve seu valor reconhecido até mesmo por papas, como Paulo III (1534-49). Devemos lembrar que, depois da Reforma Protestante, a Igreja Católica também se atualizou de modo, em grande parte, proveitoso, também não devemos esquecer de papas de valor, como João XXIII (1958-63) e Paulo VI (1963-78). Os cristãos reformados, ou protestantes, prosseguiram se expandido depois da Reforma, isso através da cultura e da ação missionária, esta que atingiu nível mundial com grandes nomes, como o sapateiro batista William Carey (1761-1834), que evangelizou os indianos. Entre outras questões, com o fortalecimento da liberdade individual e dos Estados Nacionais, a Reforma contribuiu substancialmente para a grande reforma científica que se alastrou imediatamente depois de sua ocorrência, da qual faz parte aquele que é conhecido como um dos maiores cientistas de todos os tempos, Isaac Newton, que era também teólogo. Sobre os frutos científicos da Reforma, vide o artigo A Igreja e a Revolução Científica.
Fontes: Os Cristãos, Tim Dowley, pgs 101-110 e 157; Panorama da História da Igreja, James P. Eckman, Curso Vida Nova de Teologia Básica, Volume 4, Edit. Vida Nova, pgs 62-65; Apologética Cristã, Israel Belo de Azevedo, Curso Vida Nova de Teologia Básica, Volume 6, pgs 16-17; A História Revelada dos Papas, Quero Saber, Pgs 69-70, 78-80; Uma Breve História do Cristianismo, Geoffrey Blaynei, pgs 161-176, 185-188 e 210-211.

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