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Como a Igreja Definiu as Primeiras Doutrinas?

-> Apresentação e Índice
Muitos pensam que o cristianismo surgiu de súbito com todas as suas doutrinas, o que não é verdade. O breve estudo que segue trata parcialmente do processo de definição das doutrinas fundamentais do cristianismo - tire as próprias conclusões.

Engana-se violentamente quem afirma que o cristianismo é fruto direto da irracionalidade. É verdade que Jesus não deixou nenhum documento por escrito –talvez para se evitar a veneração excessiva de objetos-, e é por esse motivo que os primeiros cristãos, em termos de teologia, pareciam razoavelmente perdidos: sabiam muito bem sobre a essência da fé, mas não compreendiam vários de seus mistérios. Foram necessários sucessivos séculos de incansáveis debates, fundamentados em direito romano, filosofia grega, estudo dos textos judaicos, análises históricas e outros variados fatores, para definirem-se alguns dos principais conceitos de doutrina cristã. Ainda hoje essa religião, tão apegada à razão, debate sobre o significado de alguns pontos de sua Bíblia.
                Logo no início da Era Cristã, várias das tentativas –talvez não tão bem intencionadas- de compreender o Evangelho acabaram em heresia: gnosticismo, marcianismo e montanismo, por exemplo. O gnosticismo, disseminado principalmente entre círculos gregos, entendia que a carne era totalmente vil e que o espírito era totalmente bom, pondo Cristo como um figura totalmente espiritual –em desacordo com as Escrituras-, chegando ao seu apogeu no ano 150 d.C. Outra heresia foi o maniqueísmo, que combinava cristianismo, zoroastrismo e conceitos religiosos orientais. O montanismo colocava em questão o formalismo e a organização humana na Igreja, entendo a inspiração do Espírito Santo de modo peculiar, sue líder, Montano, logo colocou-se como intermediário entre a Igreja e o Espírito Santo. O erro teológico do monarquianismo, outra heresia, no anseio de evitar-se o triteísmo, anulou a existência bíblica da Trindade. Os debates teológicos, que já aconteciam nos dias de Paulo, como o Concílio de Jerusalém, o primeiro da Igreja, se acaloraram nesses primeiros séculos: precisava-se, urgentemente, definir as doutrinas cristãs para se evitar erros tão perigosos quanto os citados. Fonte: Os Cristãos, Tim Dwoley, pg 37-38; O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pgs 83-88.
                Como defensores da fé, tanto mediante os hereges, quando os opositores pagãos - e suas mentiras acerca do que era o cristianismo, como que os cristãos eram canibais, preguiçosos, adúlteros e ateus -, sugiram o que podemos chamar de apologistas. Esses apologistas do segundo século dividiam-se em dois grupos: os orientais e os ocidentais, conforme as escolas das quais faziam parte, conforme a cultura predominante a que pertenciam. Entre os orientais, temos Aristides, de Atenas, que, ente 140-150 d.C. enviou uma apologia ao Imperador Antonino Pio, tendo uma versão síria completa de sua obra encontrada por J. Rendel Harris em 1889 no Mosteiro de Santa Catarina, no Monte Sinai. Justino Mártir (100-165) foi o maior dos apologistas do segundo século, escrevendo a sua Primeira Apologia ao Imperador Antonino Pio, em 150, procurando desmentir as falsidades ditas contra o cristianismo, favorecer a moralidade cristã, suas doutrinas e a figura de seu Fundador. Logo fez sua Segunda Apologia como complemento para a primeira. Em seguida podemos encontrar Taciano (110-180 d.C.), que escreveu Discurso aos Helenos, denunciando a arrogância dos helenos e sustentando que o cristianismo é superior à religião e à filosofia, esperando, assim, que os cristãos fossem tratados com mais respeito. Taciano afirma que a fé cristã tem suas raízes em tempos anteriores aos da filosofia grega, com Moisés. Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pgs 90-93.
                Atenágoras é outro importante apologista oriental que, em 177 d.C. escreveu a sua Súplica pelos Cristãos, refutando as mentiras desferidas contra os cristãos e pedindo clemência ao imperador mediante as perseguições injustas sofridas. Teófilo de Antioquia, um dos centros teológicos mais tradicionais da História da Igreja, assim como Atenágoras, converteu-se lendo a Bíblia e, em seguida, escreveu sua apologia, de nome Apologia a Autólico, um magistrado ilustre a quem Teófilo tenta trazer ao cristianismo com base em argumentos racionais, discutindo a natureza e a superioridade de Deus, comparando o cristianismo com as religiões pagãs e respondendo às objeções de Autólico à fé cristã. Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pgs 93.
                Entre os apologistas ocidentais, que desenvolviam seus argumentos mais pela singularidade do cristianismo do que nas semelhanças e superioridade deste em relação ao paganismo e às filosofias, podemos destacar Tertuliano (160-225 d.C.), nascido em Cartago e advogado em Roma: com sua lógica latina procurou desenvolver uma sólida teologia objetivada na derrubada das errôneas forças filosóficas e pagãs que se opunham à fé cristã, como foi com o livro Apologeticum, que endereçou ao governador de sua província, onde nega as acusações feitas contra os cristãos, alegando a boa conduta civil dos seguidores de Cristo, afirmando que a perseguição aos cristãos era um fracasso –pois os cristãos se multiplicavam mesmo assim- e defendeu que a moral e doutrina cristã era superior ao paganismo. Minúcio Félix, por volta de 200 d.C., escreveu Octavius, com o intuito de converter seu amigo Cecílio. Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pg 93.
                Além de apologias, os cristãos regiram com o levante dos polemistas. Os primeiros queriam justificar racionalmente o cristianismo para as autoridades, enquanto os segundos se preocuparam em desafiar as heresias. Os apologistas, vindos do paganismo, preocupavam em lutar contra a perseguição e em convencer os pagãos, já os polemistas, vindos geralmente de berços cristãos, batalhavam pela preservação doutrinária interna dessa mesma fé. De todos, Irineu é o mais famoso: nascido em Esmirna, influenciou-se por Policarpo, um mártir. Feito bispo em 180 d.C. na Gália, foi missionário bem-sucedido e lutou ardentemente contra o gnosticismo, apresentando uma extensa obra de nome Adversus Haereses -185 d.C.-, onde tentou refutar as doutrinas gnósticas através da Palavra e do desenvolvimento da tradição.: no primeiro livro Irineu nos dá fundamentos históricos, no segundo, insiste na unidade de Deus, no terceiro, refuta o gnosticismo usando a Bíblia, no quarto livro ataca o marcianismo e, no último trabalho de sua obra, defende a Ressurreição, perante a qual os gnósticos se opunham. Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pgs 94-95.
                Duas escolas teológicas principais dividiram o terreno no início da Era Cristã: a Alexandrina e a Cartaginesa. A primeira procurava, antes de tudo, instruir os pagãos sobre o cristianismo e a segunda dirigia-se mais aos problemas eclesiásticos e doutrinários. A Escola Alexandrina abriu por volta de 185 d.C., teve como diretores, por exemplo, Clemente e Orígenes. Seu foco era desenvolver um sistema teológico partindo da filosofia, de modo a apresentar uma exposição sistemática do cristianismo, procuravam, inclusive, utilizar-se da filosofia e literatura clássicas para sua formulação teológica. Clemente de Alexandria (155-215), extremamente versado em literatura pagã grega –chegou a citar 500 autores em suas obras-, liderou a escola até a perseguição lhe impedir de continuar. Seu Protrepticus ou Exortação aos Gentios, de vertente apologética, escrito perto de 190 d.C., dedicou-se a provar a superioridade do cristianismo aos pagãos; outra obra, Stromata ou Seleções demonstra seu conhecimento da literatura pagã: no primeiro livro ele apresenta a fé cristã como o verdadeiro conhecimento, no segundo livro ele demonstra a superioridade moral do cristianismo, no terceiro livro ele fala sobre o casamento cristão e nos sétimo e oitavo livros descreve o modo de vida cristão. Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pgs 95-96.
                Orígines (185-254), aluno de Clemente, também foi diretor dessa escola. Ele lançou fundamentos sobre a crítica textual da Bíblia no seu Hexapla, buscando servir os cristãos de um texto bíblico de qualidade e confiabilidade. Orígines foi um dos maiores exegetas da História. Escreveu Contra Celso, afim de debater outro livro, Discurso Verdadeiro, de Celso, um filósofo plantonista inimigo da fé cristã: um de seus pontos de defesa contra Celso é a mudança de vida que o cristianismo promove, em oposição a mesmice do paganismo. Outra de suas contribuições foi a obra de nome De Principiis (230 d.C.), sendo uma verdadeira teologia sistemática. Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pg 96.
                A Escola Cartaginesa, mais ocidental e latina, em oposição à oriental de Antioquia, encontrava-se em Cartago, Norte da África. Alguns de seus grandes nomes são: Tertuliano (160-225), vasto e ótimo escritor, que em seu Apologeticum defende os cristãos mediante as falsas acusações pagãs e a perseguição. Tertuliano, além de apologista, foi um grande teólogo, inserido conceitos sobre a Trindade em seus trabalhos, como ocorre em Adversus Praxeas (215 d.C.). Em De Amina, Tertuliano fala sobre a alma humana e em De Baptismate, comenta sobre o batismo cristão; Cipriano (200-258 d.C.), versado em retórica e direito, escreveu De Unitate Catholicae Ecclesiae, em oposição ao separatismo na Igreja, estabelecendo princípios de ordem eclesiástica. Fonte: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pg 97.
                Nas definições de doutrina, foram estabelecidos credos, ou declarações de fé, que sintetizam aquilo em que a Igreja acredita, surgidos por volta de 313 e 451 d.C. Um dos mais famosos é o Credo dos Apóstolos, definindo a Trindade, a natureza universal da Igreja, a escatologia cristã e a vida eterna, sendo usado já antes de 340 d.C. Irineu e Tertuliano também definiram proteções contra o gnosticismo em suas Regras de Fé, tidas para distinguir o verdadeiro cristianismo das heresias. Porém, todas as doutrinas, credos e regras que iam surgindo espontaneamente na dinâmica Igreja Antiga e, portanto, precisavam da aprovação da das lideranças, que se uniram no que se podem chamar de Concílios, onde se debatia sobre as doutrinas estabelecidas, sobre problemas teológicos, sobre heresias e demais fraquezas da Igreja, procurando respostas coerentes, unanimidade e a oficialização daquilo que poderia ser tido como biblicamente viável. Os maiores debates dos concílios foram acerca da Trindade (Três são Um e são Três ao mesmo tempo?) –concílios do século IV- de da Pessoa de Cristo (totalmente Deus e Homem ao mesmo tempo?) –concílios do século V. Quatro concílios se reuniram em Nicéia, Constantinopla, Éfeso e Calcedônia entre 325 e 451 d.C. Fontes: O Cristianismo Através dos Séculos, Earle E. Cairns, pg 100; Os Cristãos, Tim Dwoley, pgs 40-41.

                A verdade final a ser declarada aqui é que a doutrina cristã é tão importante para a Igreja que o conforto e poder dessa instituição têm sido postos à prova com base no entendimento de sua primazia: o cristão entende que a Bíblia carrega a Verdade e que ele, portanto, é apenas o portador dela, se necessário abrindo mão de luxos e tranquilidade para lutar por aquilo que tem por imutável. Por intermédio da doutrina é que o Grande Cisma (1054 d.C.) ocorreu, dividindo os cristãos orientais dos ocidentais, também tendo como base desvios doutrinários e morais é que Martinho Lutero iniciou a Reforma Protestante (1517 d.C.), primeiro procurando uma transformação dentro da instituição católica, porém, mediante hostilidades, apoiando uma separação, em nome de uma fé correta e nobre, embora imperfeita. Fonte: Os Cristãos, Tim Dwoley, pgs 80 e 105.

                 Natanael Pedro Castoldi

Leia também:
- A Verdade e a Fé Cristã - Filosofia
- A Sinceridade da Fé - A Expansão Inicial da Igreja

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